Burnout não é preguiça. É o corpo a gritar o que a alma já não aguenta calar.

Publicado em 16 de outubro de 2025 às 13:35

Este é, talvez, um dos textos mais difíceis que já escrevi. Difícil porque não é apenas psicologia, não é apenas conceito ou teoria de vida. É um texto grande, necessário e profundamente real. Aqui, vou partilhar contigo a minha versão pessoal, a minha experiência com o burnout. Faço-o com vulnerabilidade, porque acredito que o mais bonito da vida não é abrir os braços e dizer “eu vou curar-te”,  isso seria arrogância. O mais bonito é começar por me curar a mim mesma e, depois, partilhar esse caminho de dor e transformação para que ele possa, talvez, ressoar em ti.

 

Não escrevo de um lugar de perfeição.

Escrevo como humana, que sente, que cai, que sofre, que aprende e que se reconstrói.

E talvez seja exatamente isso que me distingue: não falo de fora, falo de dentro da ferida que me tocou.

 

É sobre a minha experiência com o Burnout,  não como termo clínico, mas como ferida vivida na pele. É sobre aquilo que me levou a desaparecer de mim e aquilo que, agora, me desafia a não me abandonar de novo.

 

Não é apenas ciência.

É testemunho.

É alma.

 

🧠 O que a psicologia ensina?

 

É um estado de exaustão física, mental e emocional, resultado de exigências prolongadas sem espaço de recuperação.

Surge no trabalho, mas também no cuidar dos outros, na maternidade/paternidade, no ativismo.

É estar sempre em alerta, sem tempo para respirar, até que o corpo começa a somatizar a dor. Não é sinal de fraqueza, é sinal de excesso, na vida.

 

Muitas vezes acreditamos que “descansar um pouco” chega.

Mas o Burnout não se cura apenas com pausa, porque não é só cansaço, é ferida.

E uma ferida não sara no mesmo ambiente que a abriu.

 

🔎 A verdade que quase ninguém diz

 

O Burnout é silencioso.

É confundido com preguiça, com falta de motivação, até com falta de profissionalismo.

Sim, ele é porta de entrada para a ansiedade, para a depressão, para sintomas físicos que o corpo não consegue mais esconder.

Sim, quase ninguém pergunta o porquê. É mais fácil julgar do que compreender.

E é por isso que precisamos falar dele, sem máscaras, sem rótulos, sem tabus, sem reduzir a experiência humana a uma palavra mal usada.

 

🌙 A experiência real do Burnout

 

O Burnout rouba-te primeiro a rotina. Deixas de ter tempo sagrado para ti própria, e tudo passa a girar em torno do que tens de dar aos outros.

Até ficar na cama mais 5, 10, 20 minutos deixa de ser preguiça, passa a ser o corpo a implorar por um espaço seguro antes de enfrentar a realidade.

E os sintomas não são lineares.

Há dias em que não consegues dormir de todo, noites inteiras em claro, como se o corpo tivesse desaprendido a descansar. Um estado de alerta constante e exaustivo.  E há outros dias em que só queres dormir, como se o sono fosse o único lugar onde podes parar de existir.

O Burnout não é abstrato: ele manifesta-se na prática, no corpo e na vida, de formas que muitas vezes ninguém vê.



🌿 Os sinais mais comuns

 

– Cansaço extremo que não passa com descanso.

– Falta de motivação até para coisas simples.

– Sensação de vazio ou desligamento.

– Alterações de sono e humor.

– Corpo a somatizar: dores, enxaquecas, tensão, problemas gastrointestinais.

 

🔄 O Burnout não está só “na tua cabeça

 

O Burnout não é invenção. Não é drama. Não é falta de garra. É consequência de várias circunstâncias externas que se acumulam até rebentar por dentro.

Ele nasce numa sociedade que glorifica o profissionalismo até à exaustão.

Num sistema que confunde dedicação com estar sempre disponível.

Num ambiente em que cargos “desafiantes” muitas vezes são apenas responsabilidades sobre-humanas, sem suporte real.

E depois, quando o corpo cede, chamam-lhe fraqueza.

Quando, na verdade, é apenas a fatura de um sistema que exige mais do que qualquer ser humano pode dar.



💬 Porque dói tanto?

 

Porque não é só físico.

É a alma a carregar mais peso do que consegue segurar.

É viver em piloto automático até se partir por dentro.

 

🌱 A zona perigosa

 

Por vezes, continuamos em ambientes que nos ferem porque acreditamos que sair seria “fracassar”.

Mas permanecer num lugar tóxico não é resiliência, é prolongar a ferida.

Curar é ter coragem de reconhecer: “aqui já não é seguro para mim.

 

🌱 O caminho da cura

 

– Reconhecer que não é fraqueza, é excesso.

– Procurar apoio profissional e redes de suporte.

– Reaprender a descansar, de verdade, não só “parar um pouco”.

– Redefinir limites: o “não” que salva é também um ato de amor-próprio.

– Reconhecer os sinais cedo.

– Procurar apoio profissional.

– Permitir-se redefinir limites conscientes e alinhados ao teu bem maior.

– Escolher ambientes que sustentam, não que drenam.



✨ Reflexão

 

Estás a descansar ou apenas a pausar para aguentar mais um pouco?

O que no teu dia é prioridade real… e o que é só exaustão mascarada de responsabilidade?

Quantas vezes ficaste onde adoeceste, acreditando que era cura?

E se o salto que hoje te assusta for exatamente o que te salva?

 

🌿 A minha experiência (alma que fala)

 

Eu própria já vivi (e ainda curo em mim) esta exaustão. Este limite do corpo e da alma. 

Já insisti em ambientes que me consumiam, acreditando que era só “aguentar mais um pouco”.

Mas aprendi, com dor, que não se cura no mesmo espaço que adoece. E dar o salto, mesmo com medo, é muitas vezes o primeiro gesto de cura.

Hoje sei que não se cura no mesmo espaço que te destruiu.

E dar o salto, sobretudo com medo, é o primeiro gesto de amor-próprio e respeito.

Eu também já acreditei que era só cansaço.

Ignorei sinais, fingi que estava tudo bem, e convenci-me de que bastava aguentar mais um pouco.

Mas aprendi, com dor, que não era falta de força, era excesso dela no lugar errado.

 

Na primeira vez que o Burnout entrou na minha vida, eu estava bem.

Fazia desporto todos os dias, ia ao ginásio, sentia-me forte, cuidava de mim, cheia de energia. Amava o que fazia.

A minha presença na vida é fazer tudo com a maior dedicação, entrega e profissionalismo, seja qual for a tarefa ou função. 

 

Ter um emprego não é só sobre pagar contas. É sobre expressar a tua essência no que fazes.

Porque o que tu fazes, mil pessoas podem fazer, mas a forma como és é irrepetível.

 

É o teu olhar, a tua sensibilidade, o teu toque humano que fazem a diferença. É isso que transforma uma função em propósito. O cargo pode ser o mesmo, mas a tua presença muda tudo.

Talvez essa entrega — genuína, inteira, viva — seja mal percebida pelos outros. Talvez mexa com a pouca profundidade de quem vive em modo superficial.

Talvez toque nas vulnerabilidades e inseguranças de quem não sabe ver brilho sem sentir ameaça. E é assim que, sem intenção consciente, te transformas num alvo.

 

Não por maldade, mas porque a tua autenticidade desperta no outro aquilo que ele ainda não consegue ser.

Vivemos num mundo onde é mais fácil atacar o que nos espelha do que aprender com o que nos inspira. Onde o brilho alheio incomoda mais do que ilumina.

E então, sem perceberes, tornas-te alvo. Não por erro teu, mas porque o que és espelha no outro aquilo que ele não compreende ou aceita.

Num mundo onde a mediocridade se disfarça de liderança, a autenticidade é sempre a primeira a ser atacada.

E é por isso que tantas vezes as almas inteiras se cansam, não pelo que fazem, mas pelo peso de serem quem são.

E a minha maior ferida é esta: a do Burnout emocional que nasce não do excesso de fazer, mas do excesso de sentir num mundo que sente pouco. 

 

Mas o Burnout não nasce só do excesso de tarefas, nasce também do vazio emocional criado pela desvalorização, quando a entrega é grande e o reconhecimento é pequeno (ou inexistente). Não nasce só da sobrecarga física, nasce também e sobretudo da desvalorização emocional e profissional.

Daquela sensação de estares a dar o teu melhor e, ainda assim, alguém encontrar maneira de te fazer duvidar de ti. De te fazer sentir pequena, dispensável, substituível.

 

E, a pouco e pouco, o corpo começa a carregar aquilo que o coração já não aguenta, a injustiça, o desrespeito, o esforço que não é visto, a ausência de reconhecimento.

O Burnout não é só o peso de trabalhar demais. É o peso de não seres vista o suficiente. Há dores que não vêm do corpo, mas do coração.

A dor de te dares por inteiro e, ainda assim, seres rebaixada. De seres a pessoa que resolve, que cria, que se entrega — e mesmo assim ver o teu valor posto em causa.

 

O Burnout não nasce só de tarefas a mais. Nasce também da injustiça emocional e profissional, da sensação de estares a dar tudo e receberes indiferença. De te esforçares para fazer o certo e, ainda assim, seres vista como o problema.

 

O que mais fere não é o trabalho, é a desvalorização. É sentires que o teu brilho incomoda quem não sabe lidar com luz. É perceberes que o teu profissionalismo, a tua ética, a tua sensibilidade, despertam no outro a sombra que ele tenta esconder.

 

A minha ferida mais profunda sempre foi a da injustiça. A de ser julgada por aquilo que sou — e não reconhecida pelo que ofereço.

Por isso, o Burnout não me levou apenas o corpo. Levou-me também a fé no justo, no ético, no humano.

Mas foi essa ferida que me ensinou algo que nunca esquecerei: há lutas que não se vencem no mesmo campo onde nos feriram. E que proteger a tua paz é, muitas vezes, a forma mais silenciosa e poderosa de fazer justiça a ti mesma.



Mas o Burnout não chega de repente. Ele instala-se devagar, rouba espaço sem pedir licença. Primeiro, comecei a trocar um treino por uma chamada de trabalho.

Depois, uma ida ao ginásio por uma “urgência” da empresa. Depois, uma folga, em “não há mais ninguém”. 

Aos poucos, o meu tempo livre foi deixando de me pertencer. As pausas tornaram-se um luxo, e o descanso, uma culpa.

Comecei a responder a mensagens fora de horas, a resolver tarefas que podiam esperar, a trocar o meu treino ou o meu tempo “livre” por mais uma urgência que nem sempre era minha.

 

Até que, sem perceber, o meu tempo livre transformou-se em “tempo sempre disponível”.

E quando dei por mim, já não havia ginásio, nem pausas, nem silêncio.

Só trabalho.

Só pressão.

Só ansiedade.

Só eu, a desaparecer aos poucos de mim.

 

O corpo vivia em estado de alerta, mesmo à noite. A mente nunca desligava.

E o coração batia como quem tenta avisar: “assim não dá mais.”

Mas eu já não sabia ouvir.

Durante meses, repeti mentalmente as vozes de fora — as exigências, as críticas, as cobranças — até que essas vozes começaram a soar mais alto do que a minha.

 

Como te contei, as idas ao ginásio começaram a ser trocadas por urgências de trabalho. Primeiro uma chamada. Depois outra. E outra.
Até que um dia já não havia ginásio, nem refeições feitas com calma, nem tempo para mim.

Deixei de comer bem — às vezes porque não tinha tempo, outras porque simplesmente já não tinha energia.
O corpo começou a mudar, e eu engordei quase vinte quilos em pouco tempo.
Mas o peso não era só físico. Era o reflexo do que estava a carregar por dentro: a dor, o esgotamento, o silêncio.

Deixei de cuidar da minha saúde, deixei de me olhar ao espelho com ternura.
Perdi a alegria, o prazer nas coisas simples, o entusiasmo e autoestima. 
Deixei de acreditar em mim — e comecei a acreditar que talvez os outros estivessem certos. Que o problema era meu.
Que devia dar mais, ser mais, fazer melhor.

Comecei a duvidar do meu próprio valor. E cada vez que o corpo gritava, eu chamava-lhe fraqueza.
Mas o corpo só estava a pedir o que a alma já sabia: “Para onde estás a ir?”

Lembro-me das manhãs em que chorava antes de sair de casa para ir trabalhar.
Lembro-me da sensação de pânico, do coração acelerado, das mãos a tremer.
Lembro-me de querer fugir e, ao mesmo tempo, sentir que não podia.

Hoje sei que aquilo não era fraqueza.
Eram alertas.
Eram os sinais que a minha alma me enviava, a perguntar:
Quanto mais vais ceder de ti só para seres aceite?”
Quantas vezes ainda vais provar o teu valor antes de te reconheceres por ti mesma?

 

Durante muito tempo, senti culpa por estar cansada. Culpa por não conseguir dar mais, por precisar parar, por não corresponder a tudo o que esperavam de mim.

Era como se o meu cansaço fosse uma falha de caráter.

Como se o simples ato de precisar descansar me tornasse menos capaz.

 

E então eu tentava compensar; trabalhava mais, calava mais, sorria mais. Tentava resolver com conversas e honestidade, aliás, como sempre fiz na vida.

Acreditava que se me esforçasse o suficiente, talvez o peso diminuísse. Mas o que eu não percebia é que o esforço constante só o tornava mais pesado. E que tentar resolver dentro do ambiente, só me tornava “demasiado sensível” como me chamavam. 

 

Essa culpa é o que aprisiona: ela transforma exaustão em dívida.

Faz-nos acreditar que estamos em falta quando, na verdade, estamos em dor.

E, enquanto o mundo aplaude a nossa “resiliência”, o corpo vai desistindo aos poucos, em silêncio.

 

A certa altura, já não era apenas cansaço. Era a perda da minha própria presença. O reflexo de uma vida em que me tornei disponível para tudo e para todos, menos para mim.

Houve um dia em que percebi que já não sabia o que me fazia bem. As coisas que antes me acalmavam já não tinham efeito. O que antes me fazia sorrir, agora só me cansava.

O prazer deu lugar à exaustão, e o silêncio, que antes era refúgio, começou a doer.

 

O corpo começou a reagir antes da mente aceitar. Vieram as noites em claro, o coração acelerado sem motivo, o aperto no peito que parecia não ter fim.

Acordava cansada, adormecia em alerta. Vivia entre a ansiedade e o medo, como se o meu corpo tivesse desaprendido a descansar. 

 

Comecei a funcionar em piloto automático. Trabalhar, responder, resolver, cumprir.

Mas já não sentia. Era como se a minha vida tivesse som, mas sem alma.

Como se eu me visse de fora, a assistir a alguém que tinha o meu nome, mas já não era eu.

 

E é aqui que o Burnout se torna perigoso: não quando o corpo colapsa, mas quando te tornas estranha dentro da tua própria vida. Quando o vazio toma o lugar da vontade. Quando o “só mais um dia” vira um ciclo sem fim.

E foi aí que percebi: o Burnout nasce quando deixamos de cuidar de nós.

 

Quando as vozes de fora, ditam o teu valor, os teus passos e a tua liberdade. 

Quando esquecemos que o corpo não é descartável, que a alma não é uma máquina, que a vida não pode ser só dar sem nunca receber.



O renascer depois da dor: porque se o Burnout não se cura no lugar onde começou, ele pode ser transformado na forma como tu decides nunca mais repetir o abandono de ti mesma.

Cada limite que colocas é uma escolha de vida. Cada “não” que aprendes a dizer é uma afirmação de amor-próprio.

E cada passo fora do ambiente que te feriu é um compromisso com a tua cura.

A prova não é sair do Burnout perfeita, sem marcas ou fragilidades. A verdadeira prova é não te abandonares outra vez dentro dele.

É aprender a reconhecer os sinais cedo, a colocar limites, a cuidar de ti no meio do caminho. A verdadeira lição é não te abandonares outra vez dentro dele.

 

Porque a cura não é ausência de feridas, é presença de amor-próprio. É ser raiz, que não cede a tempestades. 

 

Hoje, sinto-o novamente aqui. Após 2 anos do início, ainda está presente. 

Mas há uma diferença: eu já conheço os sinais.

E a lição que me chega agora é esta: o Burnout não se cura no lugar onde ele nasceu. Mas eu posso aprender a não me abandonar dentro dele.

Percebi que o que eu chamava de força… era, na verdade, sobrevivência. Não era coragem, era medo de parar. Medo de decepcionar, medo de falhar, medo de finalmente ouvir o que o corpo e a alma tentavam dizer.

Quando começas a pôr limites (e o mundo não entende): quando começas a curar-te, o mundo estranha. As pessoas que se habituaram à tua entrega sentem falta da tua disponibilidade, não veem a tua dor.
Sentem falta de como dizias sempre “sim”, mesmo cansada. Sentem falta da tua ausência disfarçada de presença.

E, quando começas a dizer “não”, chamam-te fria.
Quando te escolhes, chamam-te egoísta.
Quando já não te deixas sugar, chamam-te ingrata.

Mas não é fraqueza.
Não é desinteresse.
É lucidez.

Porque depois de tantos “sim” repetidos em prol de algo que já te fazia mal, o teu “não” é sagrado.
O teu “não” é o início do teu regresso a casa.

O outro pode nunca compreender. E não precisa. Porque o outro colou-se à versão tua que lhe servia — aquela que dizia sempre “sim”, que se doava, que se esquecia de si própria. Essa versão alimentava o conforto do outro, não a tua verdade.

Pôr limites vai parecer, no início, um retrocesso.
Vai doer.
Vai parecer que estás a perder tudo.
Mas, na verdade, estás apenas a ganhar-te.
E quem se perde quando começas a cuidar de ti, nunca te teve de verdade.

E sabes? Seres a tua própria prioridade num mundo perverso e de interesses, vai doer. Mas é a tua maior vitória. 

Depois de sentir na pele as consequências do mal que me estava a fazer, voltei a cuidar de mim.
Voltei a criar tempo e espaço para a minha própria vida.
Recuperei a saúde, perdi os vinte quilos que o corpo tinha acumulado — mas o peso mais importante que deixei para trás foi outro: o de agradar. O de precisar provar o meu valor.

Voltei a reconhecer-me na força interior que sempre tive, e não nas vozes que me tentaram convencer do contrário.
Aprendi que ficar nem sempre é lição, mas fugir também não é solução.
O verdadeiro crescimento acontece quando tens coragem de ficar consciente dentro da dor, não para te castigares, mas para compreenderes o que precisas mudar.

Hoje sei que não é preciso passar pela dor para ser forte. Mas quando a vida te atravessa, segurar-te à lição daquilo que te feriu é o ato mais poderoso de amor-próprio.

Voltei a cuidar de mim.
Voltei a reencontrar-me.
E, talvez, com mais força do que antes.

Os limites aprendem-se, muitas vezes, quando os deixamos cair.
Mas cada falha foi também um recomeço.

Sim, perdi peso.
Mas o maior peso que perdi foi o da culpa, da aprovação e da necessidade de ser aceite.
Deixei de procurar fora o que só existe dentro.
Deixei de acreditar nas vozes que não ressoavam no meu coração, porque agora sei distinguir o que sou daquilo que os outros não conseguem ser.

Hoje vivo em caminho. Hoje, Caminho-me
Não uma solução permanente, mas um percurso de aprendizagem, de autocuidado e de não desistir.
Por mais dias difíceis que existam, há sempre oportunidade de aprender com eles — e de me tornar uma versão mais inteira e mais leve de mim mesma.

 

Durante anos confundi resistência com poder. Mas resistir a tudo não é poder, é exaustão e crueldade comigo mesma.

E foi quando parei de lutar contra mim que comecei, pela primeira vez, a cuidar de mim.

A verdadeira força não é aguentar até ao fim. É reconhecer quando já não há nada para aguentar. É escolher-te, mesmo que o mundo não entenda.

 

Não sou fraca por parar. Sou sábia por me escolher.

 

Desta vez, não vou esperar estar perfeita para cuidar de mim.

Vou cuidar de mim mesmo imperfeita, cansada, ansiosa.

Vou escolher o corpo mesmo sem energia, a refeição que nutre mesmo sem vontade, a pausa pequena mesmo no meio do caos.

 

Porque a verdadeira prova não é sair do Burnout ilesa.

A verdadeira prova é não me perder outra vez no meio dele.

E sair, será uma escolha consciente, não a fuga de quem se esconde. 

Nunca vou entender os "porquês". Eu sei, falo a língua do coração. O sistema fala a língua do controlo.

Lidero com empatia; eles lideram com medo.

E quem vive no medo vê ameaça onde há brilho, vê competição onde há entrega.

Fui lembrança viva do que muitos já não sabem ser, e isso, num sistema que sobrevive de máscaras, é quase um crime.

Não fui destruída por falta de competência.

Fui ferida por ser inteira num lugar que só sabe lidar com metades.

Fui ferida por trabalhar com alma num sítio que lucra com automatismos.

Fui ferida por ver o humano num lugar que só quer números.

E é por isso que dói.

Porque o que me magoou não foi o erro profissional, foi a indiferença emocional. Dei coração. Recebi estatísticas.

Mas aprendi.

Aprendi que nem todos têm capacidade de reconhecer a luz quando ela entra pela porta.

Aprendi que nem todo o cansaço é fraqueza, às vezes é sinal de que já dei tudo.

E aprendi, sobretudo, que não há burnout que apague uma alma que sabe o seu propósito.

A maior lição que levo comigo:

Levo esta lição para a vida — não apenas sobre o trabalho, a exaustão ou os limites — mas sobre quem eu sou e o que mereço reconhecer dentro de mim.
Aprendi que nunca vamos agradar a todos.
E que, muitas vezes, o que irrita o outro em nós não é o que fazemos, mas o que somos.
Somos espelhos: às vezes refletimos o que o outro ainda não consegue ser, outras vezes devolvemos as suas próprias dores.

Mas o mais importante é perceber que o verdadeiro espelho somos nós. É conosco que precisamos estar em paz.
É a nossa consciência que temos de respeitar, o nosso tempo que temos de honrar, o nosso amor-próprio que temos de sentir — e não o que se cola num post-it bonito, mas o que nasce da carne viva, no meio da dor, e ainda assim escolhe continuar.

E não, não tenho de provar nada a ninguém.
Já me perdi tentando fazê-lo — e nem sequer foi justo.
Hoje sei que não preciso renascer outra vez,
preciso apenas reconhecer quem sempre fui.

E deixo um agradecimento ao burnout: “Obrigada por me empurrares, porque sozinha eu talvez nunca tivesse saltado.”

 

Bárbara Pereira 

 

 

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