Eu nunca corri uma maratona. Nem pequena, nem grande, nem de 5 km, nem para apanhar o autocarro. E não é por falta de vontade, é por puro respeito ao meu coração, aos meus joelhos e à minha dignidade. Uma pessoa tem de saber até onde é que o corpo aguenta e, neste caso, eu não tenho qualquer interesse em descobrir se faço parte das 1% que desmaia, das 2% que vomita, ou das 97% que tem dores existenciais durante três dias.
Mas sei como deve ser.
Dizem que a parte mais difícil não é o início, quando tens forças, entusiasmo e a adrenalina te empurra. A pior parte acontece quase no fim, quando já fizeste quase tudo, quando tens o caminho percorrido preso às pernas, quando só falta “aquele bocadinho”.
Aquele bocadinho que parece maior do que todo o resto.
Portanto, não corro maratonas. Não por preguiça, mas por autopreservação.
Chama-se amor próprio, estudem. 😌
Mas eu tenho quase certeza de que a sensação deve ser exatamente assim como me sinto agora (na Vida): aquele momento em que já percorreste mais de metade do caminho, estás mesmo na reta final… e de repente tens os três inimigos clássicos: força, cansaço extremo e medo, todos a disputarem pódio dentro do teu peito. Os três com olhos postos na liderança.
E eu ali, no meio, com uma aragem de coragem a soprar no coração.
Quase a chegar.
Quase a desistir.
Quase a ganhar.
Um quase que dói, pesa e ao mesmo tempo empurra.
É aí que mora a verdadeira maratona.
O corpo já deu tudo. A mente começa a negociar contigo. A dúvida aparece como sombra. E a força que te resta cabe num suspiro.
Não sabes se consegues.
Não sabes se vale a pena.
Não sabes se tens energia.
O único sinal que te empurra é aquele brilho no peito, pequeno mas teimoso, que diz: “Tu não chegaste até aqui para desistir agora.”
É exatamente assim que me sinto.
Eu percorri um percurso inteiro sem saber que era uma corrida. Trabalhei, curei-me, recomecei, errei, desisti de coisas que me matavam devagar, renasci quando já achava que não havia mais nada. E agora estou aqui, na reta final de um ciclo. Perto de cruzar uma linha que nem sabia que estava a correr para alcançar.
Estou cansada — não de fraqueza, mas de entrega.
Estou ansiosa — não de medo, mas de consciência.
Estou quase — e esse “quase” pesa mais do que todo o caminho que ficou para trás.
A maratona que eu nunca corri está a acontecer dentro de mim.
E sabes o que dizem os corredores? Na verdade não sei, mas imagino que seja isto: que, no final, já não é o corpo que corre, é o coração.
Talvez seja o meu coração a terminar esta corrida. Talvez seja ele a empurrar-me quando já não tenho força nas pernas. Talvez seja ele a lembrar-me, orgulhoso e ofegante: “A meta é tua. Respira. Continua. Está quase.”
🌰✨ E agora deixa-me acrescentar o detalhe transmontano desta história:
Eu venho de um lugar onde ninguém precisa de maratonas para provar resistência — basta sobreviver à vida.
Trás-os-Montes não nos ensina a correr: ensina-nos a aguentar. Ensina-nos a levantar a cabeça, mesmo quando o resto do corpo já pediu as contas. Ensina-nos que desistir pode parecer fácil… mas continuar, mesmo a arrastar pedras, é a verdadeira glória.
Nós, orgulhosamente, gente da aldeia, não desistimos. Podemos praguejar pelo caminho, podemos refilar com o clima, com a falta de pão quentinho às 7h da manhã, mas desistir? Desculpem, isso não entra no nosso vocabulário — só quando muito no discurso, e mesmo assim em voz baixa e 'entre dentes', para ninguém ouvir.
E é isso que sinto agora: não falta muito.
Dói, pesa, cansa, mas não é hora de parar.
Nem física, nem emocionalmente.
A meta está ali à frente — não se vê bem, mas sente-se.
E o coração já quer abrir o champanhe.
No fim de contas, a vida não quer que eu seja atleta. Quer é que eu tenha fôlego para não desistir. 🏁💛
Bárbara Pereira ✍️
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